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Somos todos Brasil - R. Santana
 
Eu tenho um vizinho que é meu vizinho, não é meu amigo. Damo-nos bem como vizinhos, não como amigos. Não existe nenhum conflito em nossa relação, é coisa de época, as relações de vizinhos não são como antes, naquele tempo, o vizinho sentava-se à porta do outro, à boquinha da noite, para bater papo tête-à-tête das coisas dos filhos, da roça ou da cidade, enquanto no terreiro as meninas cantavam cantiga de roda e os meninos brincavam de esconde-esconde. Hoje, é o “ZapZap”, o Facebook, o Instagram e outras redes sociais que funcionam. Os amigos são virtuais, são amigos, mas não são amigos... Pois bem, um desses dias, eu caí na bobagem de lhe dizer: “... eu teria vergonha de dizer que votei em Bolsonaro”. Pra que lhe falei isto? O homem virou uma fera! Hoje, a nossa relação que não fedia nem cheirava, ficou pior, quando lhe dou “bom dia!”, ele rosna: “hum!!!”.

Essa historinha acima ilustra o estado de espírito atual dos seguidores do presidente Bolsonaro, eles são fanáticos, “doentes”, a ponto de lhe apelidar de “mito”. Na cultura grega, os mitos eram deuses ou, super-homens. Porém, é sabido que nosso presidente é um homem com qualidades e defeitos, não, um mito. Portanto, nós que o elegemos, somos / seremos cúmplices de seu governo bom ou ruim. O escritor francês Victor Hugo deixou uma reflexão sobre a responsabilidade do povo com o seu governante: “Entre o governo que faz o mal e o povo que consente, há uma certa cumplicidade vergonhosa”. Noutras palavras, povo e governante são farinhas do mesmo saco.

Hoje, a expressão, quanto pior, melhor, não tem mais significado entre os opositores políticos e entre os partidos, nós estamos no mesmo navio, se afunda, afunda todo mundo. Mesmo, nós outros, que não votamos no capitão Bolsonaro em outubro do ano de 2018, como compatriotas, temos o dever e a obrigação de apoiar suas políticas públicas que atendam às necessidades do povo. Se por acaso, o comandante de um navio com o timo nas mãos, não souber levar o navio ao porto, antes de colocá-lo à deriva ou levá-lo ao fundo do mar, a tripulação troca o comandante e o navio toma outro destino.

Esse governo é trapalhão, não só o seu líder. Separei enésimas situações constrangedoras, mas, para não cansar os nossos leitores, elegemos as mais exploradas, as gafes “suis generis”, as gafes exploradas pela mídia falada ou escrita, leiamos:

* Nos primeiros dias de governo, num evento, a ministra da “Mulher, da Família e dos Direitos Humanos”, aprofundou as regras da educação moderna: “... menino veste azul e menina rosa”.

* Em abril de 2019, Bolsonaro em Israel, no museu do Holocausto (6 milhões de judeus sacrificados) Yad Vashem, afirmou em seu discurso que o nazismo é de esquerda, só que para o israelense, o “Nacional Socialista” de Hitler, é de direita, aliás de extrema direita.

* O Ministério da Educação ordenou que todas as escolas do país gravassem os alunos cantando o Hino Nacional e terminassem com o slogan político de Bolsonaro: “Brasil acima de tudo. Deus acima de todos”, depois, enviassem os vídeos para o MEC.

* Nos Estados Unidos, Bolsonaro e Trump reunidos, ao invés do ministro das Relações Exteriores, Ernesto Henrique Fraga Araújo, participar da reunião, como é de praxe, ele ficou de fora, Eduardo Bolsonaro o substituiu...

* Em janeiro, no Fórum Econômico Mundial em Davos, Suíça, Bolsonaro teria 45 minutos para seu discurso, falou 6 minutos, sem conteúdo significativo, foi um vexame...

* Prometeu mudança da embaixada do Brasil de Tel Aviv para Jerusalém, para agradar ao presidente Trump;


* Ricardo Valez, o primeiro ministro da Educação, declarou à revista Veja: “O brasileiro viajando é um canibal. Rouba coisas dos hotéis, rouba o assento salva-vidas do avião, ele acha que sai de casa e pode carregar tudo”.

Coletei, apenas, alguns equívocos do atual governo, mas são dezenas de equívocos em pouco tempo, os mais recentes: Ricardo Galvão, cientista e ex-diretor do INPE, foi exonerado após o governo contestar dados sobre desmatamento, mesmo diante da reação nacional e internacional; declaração de Bolsonaro sobre o desaparecimento de Fernando Augusto Santa Cruz, na ditadura militar, o pai de Felipe Santa Cruz, presidente da OAB; celeumas com as ONGs da Amazônia e declarações não diplomáticas com Ângela Markel e Emmanuel Macron, sobre os problemas ambientais (desmatamento, queimadas e grilagem) da Amazônia.

Faz-se necessário dizer que em relação à Amazônia, o presidente Bolsonaro tem razão de desconfiar das intenções subjacentes desses europeus. Há anos, eles falam em internacionalizá-la, lembro-me de um fato: o ex-senador Cristovam Buarque fazia certa palestra numa universidade americana, quando questionado por um estudante sobre a internacionalização da Amazônia, com lucidez e raciocínio, respondeu-lhe: “Como humanista, aceito defender a internacionalização do mundo. Mas, enquanto o mundo me tratar como brasileiro, lutarei para que a Amazônia seja nossa. Só nossa!"

Emmanuel Macron, presidente da França, aproveitou as labaredas altas nas florestas amazônicas para sugerir aos países ricos, um Estatuto para Amazônia, que significa, juridicamente, eles se apropriarem da Amazônia em nome da humanidade. Ora, se o Sr. Macron, com toda sua tecnologia, não evitou o incêndio da Catedral de Notre-Dame, um patrimônio da humanidade, como se arvora tomar conta da fauna e da flora amazônica? Claro, que essa atitude do presidente Macron é oportunista, pois, se ele não consegue resolver os problemas de economia do seu país e dos trabalhadores franceses, como resolverá os problemas ambientais de uma área que cabe 10 países do tamanho da França? Oportunismo e caráter duvidoso! - Louvável a posição do governo brasileiro.

Todavia, causa-me estranheza, com todas essas trapalhadas do nosso governante atual, os nossos conterrâneos, da maneira apaixonada, sem reflexão, criarem uma rede social: #todossomosbolsonaro..., os nossos conterrâneos se tivessem juízo, se fossem menos arrebatados, criariam uma página: #somostodosbrasil. Mitos e deuses são de era primitiva, nós, contemporâneos, da era de energia atômica, da exploração de espaço sideral, racionais, civilizados, instruídos, temos que aguçar o nosso senso crítico e bom senso na escolha dos nossos governantes, senão, seremos sempre uma nação subdesenvolvida, povo subdesenvolvido, sem o respeito internacional devido (não obstante, a 10ª potência econômica do mundo), seremos sempre tratados como país do terceiro mundo, como Haiti, Nigéria, Moçambique, Guiné...




Autoria: Rilvan Batista de Santana

Licença: Creative Commons
Rilvan Santana
Enviado por Rilvan Santana em 28/08/2019


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Imagem de cabeçalho: Sergiu Bacioiu/flickr