Crimes na Tran$Valores R. Santana
Crimes na Tran$Valores
R. Santana
O “professor” explicava o uso da nova tecnologia aos 15 homens que compunham sua pequena plateia com um “Data Show” que projetava numa grande tela as imagens por dentro e por fora da transportadora “Tran$Valores”, feitas por um quadricóptero com câmera Wiffi 4 de canais. Não que fosse uma aula de tecnologia, mas conhecer os cantos e os recantos da transportadora que eles iam assaltar, seria fundamental para sobrevivência de cada e levar a cabo o sucesso do empreendimento.
A preocupação do “professor” de usar a tecnologia e o planejamento na investida à “Tran$Valores”, assentava-se na ideia de crime perfeito, para que não houvesse morte em nenhum dos lados, salvo, em legítima defesa. Crime de roubo, não de pessoas, o dinheiro, necessariamente, não precisava ser manchado de sangue, mas de astúcia e inteligência.
Tudo teria que ser estudado, inclusive, o inesperado, por isto, reuniu ali, naquela chácara 15 homens, escolhidos a dedo com profissões definidas: eletricista, técnico em informática, chaveiro eletrônico, especialista em explosivo, motorista profissional, além de ferramentas eletrônicas e mecânicas.
A caguetagem invadia o espírito e a mente do professor. Se algum indivíduo “amarelasse” e denunciasse às autoridades a “Operação Águia”? A possibilidade existia, mas todos estavam cientes que se alguém delatasse a operação pagaria com a vida, inclusive, algum membro querido da família, por isto, longo foi o processo de inteligência para escolha dos 15 homens.
O Dia-D sairia naquela reunião. Porém, para salvaguarda da “Operação Águia”, e partícipes, as armas e as munições serão distribuídas na hora agá. O professor adiantou aos chefes da organização criminosa que iria utilizar os simulacros de armas para orientar os sujeitos da operação que se realizará em data próxima. Seu objetivo seria potencializar todo conhecimento para que os partícipes desenvolvessem habilidades para o uso correto e rápido das armas verdadeiras.
Por isso, faz-se necessário analisar o discurso feito pelo professor aos sujeitos de sua organização:
Companheiros, boa noite:
Nós estamos do outro lado da lei, todavia, temos consciência que não somos facínoras desalmados e latrocinas. A “Operação Águia” será exitosa se conseguirmos fazê-la sem sangue, porém, tenham certeza se acontecer algo funesto com qualquer um do grupo, sua família receberá a cota que lhe pertence na operação por ato solidário.
Um companheiro que trabalha na Tran$Valores, será decisivo na operação. Esse companheiro vai desligar a energia que alimenta o sistema de segurança, deixar o portão encostado por onde saem os carros de valores, colocar narcóticos em sucos da merenda de meia noite e avisar ao comando da organização por Whatsapp, o momento de agirmos. Este companheiro vai receber um pouco mais do que os demais, pois, ele é decisivo para que a operação seja exitosa. Ele já passou pra organização o cronograma de todas as atividades na empresa e a localização do cofre. Ele nos garantiu que nos finais de semana, os depósitos chegam ao montante de R$ 20.000 000, 00 (vinte milhões de reais), afora quilos de barras de ouro e os seguranças não passam de meia dúzia, o risco maior, é que há um alarme conectado à companhia de polícia.
Companheiros, a maioria irá receber um kit com uma pistola Glock 20, calibre .40 e 2 carregadores, mais 2 granadas, um colete a prova de bala e uma toca tipo ninja. Os comandantes da organização, levarão além do kit, fuzil AK105 e submetralhadora MT 40. Os dinamiteiros cuidarão do cofre.
A nossa estratégia é adentrarmos na Tran$Valores com 8 parceiros, dois parceiros ficarão responsáveis pelos explosivos, um eletricista, outro responsável pela informática e, os atiradores de ponta ficarão comigo, o restante do grupo ficará fora para manter a polícia distante, se numa eventualidade, os homens fardados aparecerem.
Parceiros daqui lá (usou as imagens do Data Show), têm uns 10 Km, o carro a 50 Km/h, deve levar 12 mm, com os imprevistos de 12mm a 17mm. Aqui (apontou a tela) devemos ir pela Avenida General Labatut, à direita, depois do último semáforo, ir pela Santos Dumont, pegar este atalho (na entrada, deixar para trás, uma esteira de miguelitos, na saída do atalho, postar quatro homens com submetralhadoras e granadas), 30 m depois, numa quadra enorme, é a sede da Tran$Valores. Os senhores podem observar nestas imagens, tiradas pelo nosso drone, que ao redor da empresa não há vizinhos, existe um ralo matagal, informou o nosso parceiro de lá, que a empresa comprou todos os terrenos ao redor como medida de segurança.
Enfim, discorri em poucas palavras o plano de ação de nossa “Operação Águia”. Se alguém tiver sugestão ou reclamação, fique à vontade.
- Professor, quando e onde as armas serão entregues?
- Aqui, 1 hora antes da operação. Cada parceiro receberá uma mochila com kit: pistola, munições, granadas, colete e toca! – alguém mais falou:
- Professor, esse companheiro que trabalha lá, é confiável? Já pensou em traição, caguetagem?
- Companheiro, aqui, ninguém confia em ninguém. Só os senhores sabem en passant o plano de ação da operação que discorri na minha fala, todavia, tudo que lhes falei poderá ser mudado pela organização, daqui um instante. Há 6 meses esse vigilante é subsidiado financeiramente pela nossa organização com vultosa quantia mensal, se for um alcaguete, será eliminado sem dó nem piedade e tomaremos da família tudo que foi investido – todos concordaram com o professor e a reunião foi encerrada.
Um mês depois: Dia-D.
Às 2:00 horas, o professor e seus homens esgueiravam as laterais do muro da transportadora de valores quando seu celular vibrou: “gato na tuba com rabo de fora”, a base informava em código que havia algo suspeito, estranho ao combinado e o professor tomasse cuidado. Experiente, embora jovem, ele dividiu seu grupo em dois: o grupo que ia entrar pelo portão encostado; o outro grupo, escalar o muro, desligar o sistema de alarme e, toda fonte de energia.
Antes de lhes dispersar, o professor recomendou ao líder do grupo que o portão fosse aberto com cuidado, os homens rastejando, que ele jogasse em direção ao prédio qualquer coisa que fizesse zoada, que ele não respondesse logo aos tiros, esgotasse as balas e a imperícia dos vigilantes, depois, jogasse uma granada no centro dos tiros e aguardasse 2 minutos, seu grupo iria entrar pelo flanco direito do muro e surpreender os vigias...
O professor entendeu que a mensagem “gato na tuba com rabo de fora”, indicava que o informante havia lhe traído, todavia, por inexperiência de inteligência, tinha deixado o “rabo de fora”, ou seja, algo que o denunciava à captura de imagem do quadricóptero e aos olhos do operador, por isto, o professor mudou de última hora, todas suas estratégias de ação e fez bem.
O tiroteio foi renhido, sangrento, dos 8 vigilantes escalados para salvaguardar a empresa do perigo iminente, 4 morreram de imediato, 3 feridos graves e por ironia do destino ou covardia, o informante foi o único são e salvo que sobrou, por isto, a fúria do professor:
- Canalha está satisfeito com o resultado de sua traição!? Desde o início, reneguei o sangue... você é culpado e, ”O salário do pecado é a morte. O dom gratuito de Deus é a vida”. Você vai morrer! – o homem tremia que só vara verde. Ele foi amarrado na porta do cofre e dinamitado.
O cofre estava vazio. Lá fora, os outros comparsas mantinham os policiais distantes (não eram muitos e despreparados pra o fogo intenso). O plano de fuga foi acionado: um carro-baú fugiu com a maioria dos bandidos enquanto 2 automóveis atrás davam cobertura com fuzis Ak105, granadas e a polícia cada vez mais distante, até sumirem na bruma da noite.
Dois dias depois do Dia-D:
- Professor, tanta tecnologia, falhamos e quase morremos?
- Sim. Mas, se não fosse a tecnologia não estaríamos vivos. A natureza humana é mistério... até Jesus Cristo foi traído, não?
-Sim!
Com o depoimento da família do traidor e o depoimento de um dos feridos, o serviço de inteligência da polícia chegou à maioria absoluta dos bandidos, salvo, o professor que fugiu sem deixar rastro.
Há mil anos se diz que o crime não compensa e mais mil anos se dirá que o alheio chora seu dono com as lágrimas do bem.
Autoria: Rilvan Batista de Santana
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