A cultura do ódio - R. Santana
Conheci um sujeito na pré-adolescência, brigão e polêmico, pecava pela franqueza, de quando em quando, ele estava envolvido em confusão. Não entendia a causa daquelas desavenças, porque Charqueada de costume, era um negro amigo, fiel, prestativo, solidário e generoso.
Como todo ser humano, ele tinha seus defeitos, dentre esses defeitos, tinha fama de “pavio curto”, que não levava desaforo para casa e temido pelo manejo de seu “Tramontina” de 20 polegadas.
Tinha-lhe certa afeição, pelos seus causos e, por sua proteção. Certa feita, um sujeito surgiu do nada e passou beber na bodega do meu tio Pedro, quando já tinha bebido quase um litro de cachaça e estava de cabeça cheia, quis me dar o calote: alegou que tinha deixado o dinheiro em casa. Passei lhe acompanhar aqui, ali e acolá, nada de chegar ao destino desse sujeito, quando íamos à altura do DNIT (naquela época, capoeira e mata fechada cortada por um caminho), embaixo duma Jaqueira, surge Charqueada:
- Ei moço, aonde vai com este menino!? – O cara titubeou, tremeu na base (Charqueada tinha quase 1,90 m de altura, os braços enormes e musculosos), apontou o lugar: “acolá, ali perto do...”, o meliante não completou a frase, recebeu uma bofetada em cima das fuças, caiu, levantou, tomou mais bofetadas, e pernas pra que te quero? Sumiu nas perambeiras...
Um dia, eu lhe perguntei:
- Charqueada, por que tanta rixa?
- Doutorzinho, eu não mexo com as pessoas, elas que mexem com a minha pessoa!
- Compreendo...
Hoje, 6 décadas depois, não me sai da cabeça, o significado da frase de Charqueada: “Doutorzinho, eu não mexo com as pessoas, elas que mexem com a minha pessoa”. Algumas pessoas não conseguem se relacionar com outras de forma natural, são rejeitadas sem motivo, não são simpáticas, não são envolventes, por mais que se esforcem, às vezes, elas se impõem pelo exemplo, pela firmeza e coerência de suas atitudes, mas não aceitas de bom grado, elas sempre são cutucadas de graça, sem motivo significativo. Eu sou um pouco Charqueada, eu não mexo com as pessoas, elas que mexem comigo, como não sei usar um “Tramontina”, Deus deu-me o dom da caneta.
Em 2017, fui ultrajado publicamente em sites e revistas pela direção da ALITA, daquela época, minha dignidade pessoal foi achincalhada, se tenho algum mérito intelectual foi para Cucuia, eles espalharam a cultura do ódio, muitos confrades viraram-me a cara, fui taxado de “pavio curto”, "Sujeito difícil...", não participei da primeira revista histórica Guriatã, por mais que me penitenciasse, fui alijado pela entidade que ajudei fundar. O crime que fiz, foi criticar publicamente (não tinha espaço no grupo intolerante e tendencioso), a má gestão desses próceres e lhes sugerir novos caminhos no blog que administro Saber-Literário.
Por isso, surpreendi-me quando no dia 6 de fevereiro, deste ano, recebi um e-mail do escritor Cyro de Mattos, convidando-me para enviar um texto para 3ª. Revista Guriatã, de chofre, achei que o convite não passava de um “acidente”:
“Alitanos: Enviei no ano passado vários comunicados aos membros da ALITA para que enviassem colaborações para o número 3 de Guriatã.
Recebi apenas textos de Sônia Maron, Ruy Póvoas, João Otávio e Ceres Marylise.
Estou fechando o número 3 da revista, que suponho terá o mesmo nível dos números anteriores ou melhor.
Mantenho contato com uma gráfica para obter os custos da edição em torno de 3 mil reais, abaixo dos das edições anteriores.
Quem quiser, ainda pode enviar suas colaborações para este número de Guriatã, três páginas no máximo, ensaio, crônica, conto, menos poesia, até o dia 13 deste mês de fevereiro.” Cyro de Mattos.
Respondi-lhe no mesmo dia:
“Acho que este e-mail para mim foi um "acidente", pois fui "expulso" da ALITA, mas se não foi "acidente", eu tenho 168 contos publicados, poderei selecionar o mais lido e enviar-lhe” Cordialmente, Rilvan Batista de Santana
Mesmo assim, enviei-lhe um pequeno conto infantil, despretensioso, que exalta o amor filial com o título: “O Segredo”, recebi no dia 14.02, o e-mail:
“Seu texto não se encaixa na revista Guriatã, por ser de natureza infantil, destinado ao público infantil. Obrigado.” Cyro de Mattos
Queixei-me, sabia a priori, que meus textos não seriam publicados, ele respondeu-me:
“Lembro que seu texto Jupará foi publicado no número 2 de Guriatá. Foi publicado por suas qualidades. O autor nem sempre acerta no que escreve. Nem os grandes. Perfeito só Deus. Lerei logo este novo texto de sua autoria.” Cyro de Mattos
Enviei-lhe mais um texto, desta vez, não escolhi texto infantil, mas um texto filosófico e metafísico sobre o “nada”, “O cadáver”:
“E, esse, prezado acadêmico? É um texto de adulto, inclusive, filosófico: uma discussão sobre a morte”.
“Sei, a priori, que nenhum texto meu, será publicado, porém, recebi um e-mail de V. S.ª solicitando a colaboração dos acadêmicos para completar a edição da revista.
Se não for possível não será necessário responder-me...” Cordialmente, Rilvan Batista de Santana
Não me respondeu, certamente, não será publicado. A cultura do ódio ainda continua. Lembro-me que a presidente atual me disse no Shopping Jequitibá, quando manifestei meu desejo de voltar e frequentar às sessões da ALITA: “O senhor não se sentirá confortável, não existe clima...”, e a professora Lourdes Bertol completou: “Fulano e sicrano disseram na reunião: - ele ou nós!”
Acho que eles não leram “O cadáver”, pois, lá diz:
“Ele estava ali estirado, o cadáver, o nada diante do tudo e tudo diante do nada, mas o tudo é o nada... Deus, ó Deus, onde estás que não vês o nada?! Nós todos, somos o nada diante de Ti! O nada é o cadáver, mas o cadáver já foi o tudo e o tudo um dia será o nada! O nada é o que existe...”
Autoria: Rilvan Batista de Santana
Licença: Creative Commons