Textos


Factoides políticos - R. Santana

 

     A política é uma atividade tão velha quanto à prostituição, todavia, faz-se justiça dizer que o político é um mal necessário. Aristóteles disse lá atrás (Século V a. C.), que “o homem é um animal político”, política é inerente ao homem, faz parte de sua natureza, o homem não é uma ilha e precisa se relacionar com o outro para sobreviver, além disto, política é a arte de bem governar os povos, toda atividade humana é permeada de política – política partidária, política educacional, política industrial, política de segregacionismo, política esportiva etc.
     Hoje, a atividade política partidária é estigmatizada, colocada em suspeição, confundida com desonestidade, com politicalha, porém, não deve ser generalizada, existe político comprometido com a coisa pública, honesto, desprendido de má fé, abnegado, que pensa no interesse comum e no bem do país. Não é temerário afirmar: se a situação política é ruim em todas as esferas de poder, pior seria se não houvesse a atividade política.
     Este texto não se presta denegrir ou achincalhar os políticos, mas prestar-lhes uma homenagem, trazendo à tona, algumas tiradas espirituosas e alguns factoides políticos. É evidente que se esta matéria fosse aprofundada, numa pesquisa séria, não seriam duas ou três laudas, mas vários tomos pela riqueza dos fatos e personalidade extravagante de muitos políticos.
     Ao adversário contundente, Getúlio Vargas dava-lhe uma embaixada num país distante. Sua assessoria era mestra em criar situações perigosas contra o caudilho e imputá-las aos adversários. Getúlio Vargas possuía habilidade política de adiar os interesses escusos dos amigos de conveniência e livrar-se dos adversários sem prejuízo de sua imagem de “pai dos pobres”.
     Um dos assessores de Getúlio Vargas o encontrou no banheiro fazendo a maior zoada com uma bacia e outros objetos de alumínio, preocupado, perguntou-lhe se podia ajudar, ele respondeu: “... estou tentando livrar-me de minha consciência, pois ela me aflige.” E, morreu idolatrado pelos pobres, pranteado pelos menos pobres, compreendido pelos ricos e lamentado pelos adversários e teve essa consciência quando escreveu em sua carta-testamento: “Lutei contra a espoliação do povo. Tenho lutado de peito aberto. O ódio, as infâmias, a calúnia não abateram meu ânimo. Eu vos dei a minha vida. Agora vos ofereço a minha morte. Nada receio. Serenamente dou o primeiro passo no caminho da eternidade e saio da vida para entrar na História”.
     Porém, o rei dos factoides foi César Maia no tempo que foi prefeito do Rio de Janeiro. Ele não saía da mídia com declarações controversas, polêmicas, situações comuns, tornavam-se factoides na imprensa escrita e televisada.
     Todavia, não se pode negar sua capacidade administrativa, foi prefeito por 12 anos no Rio de Janeiro, deputado federal e vereador, portanto, nem só de factoide vive o político, ele ainda é uma grande liderança política no estado fluminense, haja vista que influenciou na eleição de alguns amigos e do filho Rodrigo Maia.
     Outro político que usou de factoide à beça para se eleger prefeito e governador de São Paulo, é o deputado federal Paulo Maluf. É um dos políticos mais acusado de corrupção e desvios de dinheiro público, seu nome deu origem ao neologismo “malufar” que trocando em miúdo significa se apropriar da coisa pública ou praticar negociata. Contudo, justiça lhe faça: Maluf ainda não foi condenado por dolo no STF do dinheiro do povo, a maioria desses processos é de natureza política.
     O mineiro Pedro Aleixo tinha fama de espirituoso e quando foi vice-presidente da República, com a morte de repente do presidente Artur da Costa e Silva, constitucionalmente, ele teria de assumir a presidência do país, mas a Segunda Junta Militar o impediu de tomar posse e quando questionado por um telefonema de um famoso jornalista, fez-se de desentendido no primeiro momento e gracejou depois:
          - Doutor Pedro Aleixo, quando vai assumir a presidência?
          - Assu... mir... assu... mir... não estou... entende... fale!
          - O senhor assume a presidência com a morte do general?
          - Eu assumi!? Eu vou sumir!... – desligou o telefone.
     Dentre os mais espirituosos, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, Lula para o povão, é o mais desprendido, o mais popular, quando presidente da República, na praia de Inema, Base Naval de Aratu, Salvador, deixou- se fotografar com uma caixa de isopor na cabeça, os moleques arteiro brincaram que o ex-presidente estava cheio de “manguaça”.
     Contudo não foi o primeiro factoide de Lula, certa feita foi flagrado fazendo pipi no jardim do palácio. Porém, o factoide que lhe rendeu mais notoriedade de pouco afeito aos livros, foi quando Lula, de óculos, terno e gravata, lia, circunspecto, um livro de cabeça pra baixo. Aí é demais!...
     O saudoso Antônio Carlos Magalhães foi o mais carismático dentre todos os governadores da Bahia até hoje. Não se sabe se movido pela fé ou proveito político, apoiou o sincretismo religioso baiano como ninguém, assíduo frequentador dos terreiros de candomblé e o primeiro a lavar as escadas da igreja de Nosso Senhor do Bonfim nos dias de festa em Salvador.
     ACM não perdia uma festa de Iemanjá, depois de jogar o balaio de flores, velas e perfumes para rainha do mar, saía abraçado com as baianas, seguido pelo povão, sob os olhares eletrônicos dos paparazzi tupiniquins e repórteres de todo o país. Ele não perdia a oportunidade de abraçar uma velha alquebrada pelo tempo, ou, beijar uma criança no colo da mãe, os gestos eram voluntários, mas intenção era planejada.
     Heitor Dias, advogado de quatro costados, político de mancheia, foi vereador e prefeito de Salvador e senador dos baianos nos idos de 1970, ficou célebre por suas tiradas demagógicas, dentre muitas, esta merece registro:
          - Rapaz como vai seu pai? Dê-lhe o meu abraço! – o rapaz ficou meio sem jeito, mas...
          - Senador, faz 20 anos que o meu pai morreu!
          - Morreu pra você, filho ingrato, para mim, ele continua vivo em meu coração!
     Aqui, no torrão itabunense e sul baiano, o saudoso José de Almeida Alcântara, prefeito nos anos 60, era mestre em produzir factoides, os demais políticos são de pouca cultura, alguns semianalfabetos, outros, de pouca imaginação.
     José de Almeida Alcântara foi prefeito de Itabuna por 02 (duas) vezes e deputado estadual da Bahia. Ele possuía um carisma inato, amado pelo pobre e admirado pelo rico. A meninada o chamava de seu “arranca”... Gostava de distribuir caramelos aos pacotes à molecada. Quando chegava numa casa por mais pobre que fosse, adentrava na sala e ia tomar café na cozinha só para prestigiar o dono da casa e tornar-se igual. Seus comícios eram feitos em cima de carroceria de caminhão, não havia showmícios. O transporte do povo era feito em caminhões, carroças, e ônibus fretado pelos seus seguidores fanáticos.
     Naquela época, a corrupção eleitoral era praxe, o poder econômico prevalecia na eleição, mais voto tinha quem mais recurso financeiro tivesse, Alcântara não usava deste expediente eleitoreiro para se eleger, não tinha necessidade, seu eleitor tomava o dinheiro do rico e votava nele que não possuía lá esses recursos.
     Seus desprendimentos viraram folclores, conta-se que certa feita, um rapaz pediu-lhe um sapato pra casar, sem condição de atendê-lo de imediato e pela necessidade do outro, ficou descalço e deu o sapato ao noivo. Doutra feita, usou o dinheiro da coletoria (antes de prefeito foi coletor estadual) para socorrer com alimentos e cobertores os desabrigados duma grande enchente em Itapé
     Alcântara morreu nos braços do povo, vítima de um AVC, no meio do seu segundo mandato de prefeito. Foi o maior acontecimento fúnebre da cidade e do Sul da Bahia, naquela época, milhares de pessoas velaram-no e outro tanto acompanhou o seu sepultamento. Mesmo depois de morto, foi notícia muito tempo um incidente que ocorreu: na salva de tiros que se faz para as autoridades, um gaiato no meio do povo, gritou “o homem ressuscitou”, foi gente espirrando por todos os lados, muitos foram socorridos no hospital pela gravidade.
     Outro político tupiniquim que será lembrado pela posteridade será o ex-prefeito Fernando Gomes, tanto pelo seu tino administrativo quanto pela sua ignorância do português. Foi prefeito de Itabuna 4 vezes e deputado federal 2 vezes, com votação expressiva.
     Quando começou na política, mencionava como trunfo administrativo e mudança de vida, ter sido vaqueiro e se tornado um grande pecuarista e cacauicultor. No início não queria ser político, depois tomou gosto quando foi prefeito pela primeira vez indicado por José Oduque Teixeira.
     Fernando Gomes virou folclore pelo uso incorreto do idioma, logo, deram-lhe o apodo de “Fernando Cuma”, os entendidos em marketing, afirmam que é um artifício para não sair da boca do povo, ou seja, “fale mal, mas fale de mim”.
     O seu cabeleireiro, rapaz debochado, fez uma aposta com seu colega de trabalho que em cinco palavras, ele erraria quatro, não deu outra, na oportunidade que surgiu quando ele foi fazer o cabelo e a barba, na fase da barba, o cabelereiro provocou:
          - O de sempre prefeito?
          - Cuma?
          - O senhor não gosta de creme de barbear, não é?
          - Sim. Moie, arcool e tarcol! – aposta ganha.
     Porém, justiça lhe faça, foi um dos melhores prefeitos, tanto quanto Lula, fez muita coisa pela educação e esporte de Itabuna.

 



Autor: Rilvan Batista de Santana

Licença: Creative Commons

Membro fundador da Academia de Letras de Itabuna - ALITA

Rilvan Santana
Enviado por Rilvan Santana em 08/07/2015
Alterado em 02/08/2023


Comentários


Imagem de cabeçalho: Sergiu Bacioiu/flickr