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Os sinos dobram no Natal - R. Santana
 

     Maria Clara estava internada na unidade de terapia intensiva há 2 dias no Hospital Infantil itabunense Manoel Novaes. Inicialmente, os pais pensaram que fosse mais uma das gripes ou infecções de garganta que ela costumava ter: dor de cabeça, febre, vômitos, etc., mas à medida que os sintomas foram piorando seus pais levaram-na ás pressas para o hospital e se descobriu um quadro bacteriano de meningite. O susto foi grande, os pais ficaram apavorados com o diagnóstico. O contágio com alguém infectado, certamente, tinha sido na escola, pois Mariana e Carlos são pais extremados no cuidado com sua pequena de 8 anos de vida.
     Enquanto Carlos aguardava notícias médicas do estado de saúde da filha, nos corredores contíguos da UTI, Mariana recorria ao poder da Providência na capela do hospital. Ambos, marido e mulher (ela mais do que ele), são religiosos de muita fé. Sabiam que a meningite é uma doença grave, às vezes, deixa a vítima com sequelas irreversíveis ou leva o indivíduo à morte, portanto, nada demais pedir uma mãozinha a Deus, em particular, Nossa Senhora Aparecida, protetora do casal, mesmo com a confiança do médico:
     - Mãe não fique tão ansiosa, todas as providências foram tomadas no início dos sintomas, além disto, a medicina atual dispõe de medicamentos de última geração para combater esses “bichinhos” da meningite, agora é dar tempo ao tempo...
     A febre insistia deixar Maria Clara, não como antes que seu corpo ardia de quente, contudo a febre permanecia menos intensa. As visitas foram proibidas, além da equipe médica especializada, somente os pais podiam entrar na unidade de terapia intensiva, mesmo assim, com os rigores padrões: visita individual, vestimenta adequada, mãos higienizadas, máscara e pouco tempo de visita. No quinto dia da doença, ela ainda não estava completamente lúcida, apresentava certa confusão mental, o pessoal da saúde se desdobrava em cuidados.
     Mariana não arredava pé do hospital, só não dormia porque não era permitido. Ela almoçava em casa e lanchava na cantina do hospital. Faz-se necessário dizer que era mês de dezembro de 2012. Começou preparar a casa para os festejos natalinos, mas com a doença súbita da filha, deixou casa e outros afazeres para se dedicar à pequena. Se fosse uma doença menos grave, conciliaria casa e doença, mas com meningite não se descuida, que os festejos de Natal ficassem para outro ano, agora, só desejaria que Papai-Noel trouxesse no seu saco de brinquedos, um brinquedo chamado saúde para presentear Maria Clara.
     Parodiando o filósofo, diria que a vida tem razões que a própria razão desconhece, a partir do sexto dia de UTI, Maria Clara foi melhorando a olhos vistos, e, no oitavo dia, foi transferida para um apartamento de um leito, curada!      A doença foi definitivamente debelada, resultado de exames complementares, nada demais se sua cura fosse atribuída à ação de medicamentos específicos, mas a menina saiu da semiconsciência para consciência plena num estalo e uma conversa mística, visionária, que os menos crentes atribuíram ao delírio da doença:
     - Juro por Nossa Senhora Aparecida!
     - Não blasfeme filha... papai do céu... é pecado... – a mãe cheia de dedos. A menina desabou em choro:
     - Mãe... mãezinha... ela rezou na minha cabeça... mãezinha é verdade... – a mãe pondera:
     - Sonho, filha!
     -Não!!! – nervosa.
     - Não foi sua enfermeira?
     - A enfermeira dormia quando ela veio me ver. Ela é tão bonita e cheia de luz que iluminou tudo. Não estou mentindo, mãezinha!
     - Bem, ela disse o quê!?
     - Hoje é Natal filha. Hoje, os sinos dobram em esperança e misericórdia para todos os homens.
     Mariana não costumava refletir, agia por instinto quando algo lhe tocava o coração. A fé não se esmiúça, agarra-se, e, Maria Clara estava curada. Ajoelhou-se e orou, orou, orou...

Autor: Rilvan Batista de Santana

Licença: Creative Commons

Membro da Academia de Letras de Itabuna

Rilvan Santana
Enviado por Rilvan Santana em 03/12/2014
Alterado em 22/11/2023


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Imagem de cabeçalho: Sergiu Bacioiu/flickr