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Franga saradona R. Santana

Franga saradona
R. Santana
 
Não foi por acaso que encontrei o velho Tanaguchi, novamente, na Praça Olinto Leone, dizer que foi por acaso seria faltar com a verdade aos meus estimados leitores, não faria isso nem pra ganhar a sorte grande da Mega-Sena ou o prêmio Jabuti, é que “a palavra voa, a escrita fica e o exemplo permanece”, portanto, mentir não é bom exemplo, conheço todos os hábitos do velho Tanaguchi e parodiando o dito a Maomé: “Se Tanaguchi não vai a Narvil, Narvil vai a Tanaguchi”, acrescento ainda, que o velho estava bem humorado e recebeu-me cheio de pilhéria:
- Lá vem o bisbilhoteiro do conhecimento!
- Você quis dizer curioso, né?
- Além de mexeriqueiro e intrometido...
- Se é assim, fui! – zangado.
- Estou brincando Narvil, gosto de sua bisbilhotice, incita a minha imaginação – continuou:
- Hoje, estou alegre, descontraído, ainda não percebeu?
- Percebeu o quê?
- Estou menos formal, não usei os pronomes e os verbos na 2ª. pessoa como dantes, eu estou brincalhão e você quer contrariar meu humor?
- Desculpe-me Tanaguchi, estou uma pilha!
- Para lhe relaxar, vou contar a fábula da “Franga saradona”, quer que lhe conte ou não?
- Claro, ó homem dos livros! Que o meu mau humor vá para as Cucuias!
- Então, sente-se e ouça:
- Em uma fazenda não muito longe daqui uma franga tinha desde cedo um comportamento diferente: ciscava bastante, brigava com as galinhas, ranzinza, criava caso com os pintos, com os frangos, com as frangas, com as galinhas e só esbarrava na autoridade do galo, não por medo, mas por admiração porque um dia seria, também, galo daquele terreiro.
Seus pais preocuparam-se desde cedo com o comportamento estranho da filha e levaram-na a vários especialistas da mente, todos foram unânimes no diagnóstico: megalomaníaca, superestima e concluíram que a franga não era frango, mas uma fêmea igual às outras, exceto, na personalidade exacerbada.
A franga não ficou contente com o diagnóstico, não tinha nada de cabeça, apenas pensava como um galo, isto não é doença, mas uma opção de vida, portanto, ia buscar na ciência médica, complementos físicos que lhe faltavam e contratou os serviços dos doutores Zé Galo e Zizi Pavão – aí, eu o interrompi:
- Meu caro Tanaguchi, os médicos não diagnosticaram que seu problema era de super autoestima, pra que mais médicos?
- Médico de físico é outro, continue ouvindo:
- Doutor Zé Galo fez as cirurgias plásticas: aumento das cristas e o implante de esporões pontiagudos para defesa e ataque e conformou o pescoço; a Drª. Zizi Pavão cuidou da beleza: hormônios para tornarem as penas mais brilhantes no pescoço, asas e costas, encompridar as penas do rabo e para o crescimento, enfim, eles deixaram a franga um “galo”.
Fez-se no galinheiro uma grande festa para apresentação do novo “galo”... Todos os galinheiros circunvizinhos foram convidados, no auge da festa o mestre de cerimônia anunciou o canto dos machos velhos e o canto do novo “macho”, os machos velhos estridularam seus cantos com um som agudo e penetrante:
- cocoricó, cocori, cocori, cocoricó, cocori, cocori!!! – os machos velhos fizeram seus cantos serem ouvidos por toda fauna arredor, mas quando o “macho” novo cantou...
- có, có, có, có!... – o som foi grave e abafado, uma vergonha, protestou o galinheiro, não era canto de macho, a franga não era macho, um engodo, uma falsidade, propaganda enganosa!!!
O novo “galo” quedou-se e chocou, chocou, chocou...
- Eis aí a lição meu caro Narvil: mexe-se na aparência da criatura, mas a natureza é obra de Deus.

Autor: Rilvan Batista de Santana
Licença: Creative Commons
Rilvan Santana
Enviado por Rilvan Santana em 07/07/2014


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Imagem de cabeçalho: Sergiu Bacioiu/flickr