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Carta para Júlia (II)

Carta para Júlia (II)
R. Santana


Querida Júlia:

Nunca mais lhe dei notícias minhas, aliás, a recíproca é verdadeira. Mas, deixemos de lado essas picuinhas e cobranças, irei me ater às notícias literárias e sua desenvoltura à frente dessa casa de saber acumulado.
Não mais ouvir falar de sua casa. Quais são os projetos para 2014? Em 2013, salvo algumas ações internas de somenos importância, não soube de nenhum feito relevante de sua administração. Querida Júlia, a sociedade atual não é mais utópica nem se contenta com tertúlias estéreis, reuniões que não decidem e inócuas, palavrório sem significado...
Hoje, não é mais aquele tempo de saraus e serenatas, quando a poesia de versos românticos e os livros tomavam conta dos espíritos refinados e ciosos de conhecimento, ler naquela época, era um passatempo lúdico e uma necessidade intelectual, diferente dos tempos atuais de notícia sucinta, rápida, dinâmica e informatizada, portanto, a administração moderna de uma casa de arte e cultura tem que se adequar à realidade de que a informação de ontem é velha e não mais estimula o leitor.
Querida amiga, nem sempre o eleito para administrar uma entidade é aceito por todos os seus pares e pela comunidade que ele está inserido, não faz muito tempo (resguardando as proporções históricas), o cardeal Joseph Ratzinger, Bento XVI, foi escolhido para liderar sua igreja, mas desde cedo, enfrentou uma enorme oposição dentro e fora da comunidade católica, porém, mudou o curso da história e renunciou no momento certo, quando entendeu quão difícil é a conversão de forças reacionárias e mudar vícios e vicissitudes arraigados. Longe de mim, eu lhe sugeri que renuncie, porém, é necessário generosidade e sabedoria para liderar cabeças inteligentes.
Júlia, a grandeza da alma no ocaso da vida é o que conta, os conceitos cartesianos e racionais devem dar lugar ao bom senso e ao entendimento do outro, não estigmatizá-lo e marginalizá-lo. Entendo que a nossa idade e a nossa saúde não mais permitem alimentar a indiferença, o ressentimento e o ódio. É sabido que ninguém é melhor do que ninguém... A vaidade, o orgulho, a presunção, a soberba e a arrogância afastam o homem do caminho do bem e de Deus.


Nunca alimentei a ingênua fé de imortalidade literária, eu não produzi ainda prosa ou poesia nesse patamar, aliás, eu não me considero um artista da palavra! Quando entrei na sua casa, não me moveu nenhuma vaidade intelectual ou imortalidade, mas moveu-me o desejo de contribuir para divulgação de nossas produções tupiniquins e levar essas produções ao conhecimento de jovens e adultos através da escrita e da leitura. Modestamente, eu consegui esse objetivo sem o seu respaldo e dos meus pares, mas por intermédio do “Saber-Literário”, “Itabuna Centenária”, portal “Domínio Público–MEC”, e, outros instrumentos de comunicação moderna.
Querida amiga, cercear, advertir, censurar, limitar palavras e ações, não ajudam agregar, mas são elementos que geram antipatia e desconforto administrativos, gerando, inclusive, renúncia e afastamento dos membros de sua casa. Liderança e carisma são dons inatos, porém, eles podem ser adquiridos pela predisposição e exercício. Qual o significado para comunidade de sua casa se ela não deslancha? Discussões, propostas e projetos que não saem do papel, o destino é a lata de lixo!...
A entidade deve estar acima das vaidades pessoais. A entidade não deve atender interesses individuais de fulano ou sicrano em detrimento dos demais. A entidade deve ser una e trabalhar com o objetivo de atender o pleito de todos os seus membros à medida de suas possibilidades financeiras e operacionais. Se uma entidade literária ou científica desvia do seu papel cultural e social para dar atenção a antiprojetos e projetos individuais, o esfacelamento e a divisão serão as consequências dessa entidade.
Enfim, querida Júlia, dirigir uma entidade de tantas mentes articuladas, algumas ardilosas e envolventes, é preciso que tenha o “jogo de cintura”, o desprendimento e a inteligência de um grande atacante de futebol que se sentindo impossibilitado de driblar os volantes e os zagueiros adversários, renuncia a autoria do gol e lança a bola para um lateral ou um meia com mais condições de finalização, às vezes, ele tem mais aplausos e reconhecimento de que se tivesse feito o gol.

Cordialmente,
Narvil

Autor: Rilvan Batista de Santana
Licença: Creative Commons
Rilvan Santana
Enviado por Rilvan Santana em 01/02/2014
Alterado em 01/02/2014


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Imagem de cabeçalho: Sergiu Bacioiu/flickr