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A face obscura do homem - Recaída (Capítulo 26)

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Recaída


Dois meses depois da morte de Rita, a paixão reprimida, os trabalhos da igreja, as carnes latejando sexo e a ausência constante do doutor José Maria, contribuíram para novo affair de dona Clô e o padre Gaiardoni. Se antes as coisas eram escondidas, agora, Apolinário tomava mais precaução nos encontros com a mulher do advogado.
A beatice de dona Clô ajudava os adúlteros, ela entrava e saía da casa do pároco sem despertar suspeita, quem iria macular a honra de uma mulher religiosa, fazendeira, voluntária social e esposa de um dos mais proeminentes homens da terra? Por outro lado, o padre Apolinário Gaiardoni aparentava o guardião mais severo dos princípios morais e religiosos. Se uma paroquiana ousasse vestir um vestido extravagante, fora dos padrões normais, era chamada a atenção e se insistisse, ela seria convidada não participar das missas enquanto não refizesse suas atitudes, além do castigo de rezar centena de Padre Nossos, Ave-Marias e Santa-Marias.
Dois meses depois da morte de Rita, Apolinário Gaiardoni, ultimava também, a reforma da igreja e esperava inaugurar a nova igreja no Natal. Mandou construir laje onde tinha telhado, ampliou o salão da assembleia, construiu sanitário público, gradeou alguns espaços e fez uma bela pintura. Não tinha tempo para nada, todas as tensões que o afligiam despareceram na labuta do trabalho.
Os paroquianos vibravam com o trabalho do seu pároco. Todos queriam sua igreja bonita para o cinquentenário de emancipação política de Itabuna. Embora faltasse algum tempo, havia um clima bairrista com o município de Ilhéus e o cinquentenário da cidade reforçava sua independência, por isto, desde o ano de 1955, quando o prefeito Ferreira da Silva, reestruturou e modificou algumas ruas como a Duque de Caxias, Miguel Calmon, Rui Barbosa, Barão do Rio Branco, culminando com a Rua da Lama, Sete de Setembro, J.J. Seabra, Avenida Cinquentenário... – Hoje, a Avenida Cinquentenário é a principal rua comercial da cidade.
Esse tempo de paixão recolhida pelo padre fez de Clô mais amante e menos esposa com José Maria. Na cama mostrou-se devassa, mais despudorada, mais lasciva, mais lânguida, deixou de lado o papai e mamãe, o feijão com arroz, e, partiu para feijoada completa que deixou José Maria assustado:
- Querida, houve o quê?...
- Hem!?
- Você está diferente... Antes tudo era pecado!
- Eu era boba... não quero perder meu maridinho para outras... – dengosa.
-Nunca irá me perder!
-Nem pra Lia?
- Lia é um caso!...
- E, se eu tiver um caso?...
- Eu mato você e o seu caso!
- Você não tem um caso?...
- Mas é diferente...
- Qual a diferença!?
- Eu sou homem!
- Adultério é crime, não é um ilícito civil! – José Maria, mais humorado, usou a persuasão:
- Minha filha, eu sei que tu és inteligente, bem informada, mas é uma coisa cultural, nenhuma uma lei vai modificar a consciência coletiva de um dia pra noite. A sociedade aceita o homem ter seus casos fora do casamento, mas se a mulher tiver desonra a família!
-É hora de mudar!!! – destilando ódio...
- Eu sou advogado, sei que a lei é dinâmica, depende muito da consciência social, porém, desde Bíblia que tem mulher adúltera e homem com harém!
- É uma realidade...
Aquilo que não tem jeito, jeito é aceitar, mas não se conformar... Dona Clô nunca se conformou, cedo, rompeu com alguns ditames dos pais. Se tivesse sido do gosto do seu pai teria estudado o suficiente pra fazer uma cartinha, mas estudou o suficiente pra ensinar e era dona de muitas prendas: era exímia no bordado, no piano, na pintura, na culinária e na administração doméstica.
Atribuía o seu caso com o padre Apolinário à sua carência afetiva, não que lhe faltasse nada de material, tinha uma casa confortável, empregados à disposição, três lindos filhos, mas nunca se conformou com a vida da rua do marido. Quantas vezes desejou tê-lo de lado? E, quantas vezes ele chegou farto de sexo? Inúmeras! Por isto, se rendeu às primeiras cantadas melosas de Apolinário Gaiardoni.
Recaída justificada...
Rilvan Santana
Enviado por Rilvan Santana em 24/09/2012


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Imagem de cabeçalho: Sergiu Bacioiu/flickr