Textos


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A educação do ódio

Houve tempo para ouvir as últimas frases de Apolinário: “o salário do pecado é a morte”, “quem prevarica tem que morrer”, “Deus pune com a espada os infiéis” e “o adúltero é queimado no fogo do inferno”. José Maria não sabia qual a razão de tanto ódio, a priori, reprovou a educação do ódio que o sacerdote estava passando para criançada. Talita e Samuel vibravam com o desfecho da história, Júnior estava meio absorto e Clô só faltava pular da cadeira de tanta admiração pelas palavras de sabedoria do padre. Ele soube depois que Apolinário lhes contava a história de infidelidade de Betsabá e o rei Davi e a profecia de Natã. Davi após engravidar a mulher de Urias, um dos seus dedicados oficiais, ordenou-lhe que deixasse de imediato o front e voltasse para casa, porém, Urias desobedece-lhe com base no código de guerra dos hititas que proibia o sexo antes da luta, na casa do sem jeito, o rei ordena aos seus oficiais que deixassem Urias sem apoio militar e fosse morto pelos inimigos. A Bíblia registra que as profecias de Natã foram cumpridas: houve grandes tribulações no Reino de Israel, o primeiro filho de Davi e Betsabá morreu e também o príncipe Absalão. A paz e a prosperidade voltaram a reinar em Israel com a morte de Davi e a assunção do seu filho Salomão com Betsabá. Uma história contada e recontada por todas as gerações, hoje, de somenos importância, apenas de valor histórico, que não ofereceria nenhuma reprovação do dono da casa se não fosse o sutil veneno retórico de Apolinário. Ele usava um dos pecados do homem para colocá-lo pouco e pouco contra mulher e filhos já que era sabido de todos que ele tinha amante, por isto, entrou de supetão na sala e na conversa: - Posso saber o motivo de tanto ódio, padre? - Não, não é ódio, é justiça divina! - Não entendi!... - Fiz um comentário do crime de Urias, com a garotada e dona Clô... - Ouvir o final de sua conversa, desculpe-me, mas não entendi o motivo de tanto ódio!? - Ódio dizer que “o salário do pecado é a morte” ou “quem prevarica tem que morrer”, por exemplo? - Jesus Cristo veio para perdoar... - Sim, Porém, quem busca o arrependimento, o pecador contumaz, lhe é reservado o fogo do inferno! – Talita cochichou no ouvido de Samuel. - Engraçado... (risos) padre... (risos)... o senhor não leu o capítulo do Evangelho que Pedro pergunta: “Senhor, até quantas vezes meu irmão pecará contra mim, que eu lhe perdoe? Até sete vezes?” Respondeu-lhe Jesus: “Não te digo que até sete vezes, mas até setenta vezes sete” (Mateus 18:21-22). O bom senso diz nesta leitura que setenta vezes sete, é a predisposição infinita de Deus perdoar. Noutra passagem do Evangelho, Jesus Cristo desafia o homem e lhe proíbe de apontar o dedo quando uma mulher é flagrada em adultério e teria que ser apedrejada de acordo a lei mosaica: “Quem não tiver pecado atire a primeira pedra” (João 8,1-11). – E, finalizou: - O senhor no seu ministério não deveria fazer o mesmo!? - Além de padre, eu sou um ser humano, limitado, não tenho a natureza perfeita de Jesus Cristo. Hoje, as vicissitudes são maiores e o homem está mais consciente dos seus erros e o custo de sua infidelidade! - O senhor deveria trocar o Novo Testamento pelo Torah dos judeus em suas missas... - Doutor José Maria, a Bíblia é o Novo Testamento e o Velho Testamento, um texto completa o outro! - Mas, Jesus pregou novos tempos, uma Nova Aliança, reduziu os 10 mandamentos do Pentateuco em dois, não pregou “olho por olho e dente por dente”, portanto, ele não pregou o ódio, mas o amor!... – os meninos bateram palmas. Apolinário reprovou-os: - Filhos, Deus ralha com meninos intrometidos e mal educados! – José Maria define a educação dos filhos: - Meus filhos, mais respeito com o nosso sacerdote – virando-se para Apolinário: - Padre, eu quero que os meus filhos cultivem o bem-querer, o amor, o Deus complacente, o Deus de misericórdia, o Deus de perdão, o respeito a todos, e, não o sentimento de vingança, de maldade, enfim, a educação do ódio! O padre saiu bufando de raiva, pelo menos, uma semana José Maria ficou livre dele. Dona Clô reclamou o tempo todo com o marido, alegava birra do marido com o santo homem e culpava os filhos pelo malsucedido da conversa.
Rilvan Santana
Enviado por Rilvan Santana em 23/09/2012


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Imagem de cabeçalho: Sergiu Bacioiu/flickr