Textos


A saga de escritor - R. Santana

     Eu não sou escritor, eu sou escrevedor, aquele que escreve sem compromisso de ser escritor. Honraria muito, se eu fosse escritor, mas ser escritor não significa somente escrever, hoje, significa produzir obras literárias ou científicas, ter uma editora por detrás, patrocínios publicitários, acima de tudo, além de tudo, ser reconhecido como escritor. Às vezes, as pessoas pensam “que me finjo de boneca pra ganhar retalho”, mas não é verdade, as pessoas me conhecem como “professor” ou simples cidadão, não sabem nem têm obrigação de saber do meu gosto pelo uso da palavra oral e escrita.

     Desde adolescente que escrevo, naquela época, não havia Internet, nem informática, se escrevia manuscrito no caderno escolar ou se datilografava, muito tempo depois, surgiu o mimeógrafo: equipamento que reproduzia muitas cópias com a mesma matriz. Os jornais não davam espaço aos escritores desconhecidos, mesmo os articulistas e cronistas conhecidos, o espaço concedido era mínimo, eles privilegiavam as notícias jornalísticas e os espaços publicitários.

     Certa fase da juventude queria ser advogado criminalista, impressionava-me Wilde Lima, Waly Lima e as astúcias de Raimundo Lima nas sessões de júri popular no ‘Fórum Ruy Barbosa de Itabuna”, mas faltava-me fôlego, presença de espírito, raciocínio inteligível, também, péssima dicção e vícios de linguagem. Deu-me a esperança que Demóstenes, o maior orador da Grécia Antiga, ele era gago, contudo, com perseverança e superação física, ele alcançou o grau máximo da oratória. Diz a história que, corria na praia declamando poemas contra o vento em voz alta ou usava seixos na boca para discursar pra ninguém... A história das “Catilinárias” do romano Cícero e a oratória política do ateniense Péricles, também, me impressionaram.

     Mas, desiludido de ser advogado (condições financeiras) de ser grande orador, homiziei-me na escrita. Escrever é um ato solitário, com o domínio da língua, algum subsídio teórico, transpiração, inspiração, o talento que Deus me deu, comecei escrever em tempos idos. Naquela época, eu escrevia porque a cabeça fervilhava de ideias, queria ser um Machado de Assis, um Euclides da Cunha, um José de Alencar, um Victor Hugo, um Shakespeare, mas, descobri que Deus tinha me dado poucos talentos, não o talento que pensei ter. Hoje, escrevo por necessidade pra diminuir a ansiedade e alimentar a alma e confortar o coração.

     A Bahia é um celeiro de grandes escritores, grandes poetas, artistas de mancheia, músicos, oradores e cientistas. Todavia, para meu gozo pessoal, li e gosto dos melhores de Itabuna: Jorge Amado (nasceu na fazenda Auricídia, Ferradas, Itabuna), Cyro de Mattos, Marília Benício dos Santos, Francisco Benício dos Santos, Jasmínea Benício dos Santos, Valdelice Pinheiro, José Dantas de Andrade (Dantinhas), Plínio de Almeida, Adelindo Kfoury, Helena Borborema, Firmino Rocha, José Bastos, Hélio Pólvora, Telmo Padilha e Ariston Caldas. Estes itabunenses dispensam loas porque são conhecidos e reconhecidos como poetas e escritores, aqui, ali e alhures.

     Escrever é uma necessidade mental e difícil, porém, escrever faz bem à saúde mental, o sujeito puxa das profundezas da mente suas ideias, quem já escreveu um romance, um ensaio, uma novela, uma tese científica, sabe que é um trabalho hercúleo, mais de transpiração do que inspiração, às vezes, o escritor apaga uma página inteira para refazê-la a gosto, porém, quando conclui o feito, é prazeroso e realizável.

     A história da literatura comprova que nem sempre quantidade é sinônimo de sucesso, de reconhecimento, de aprovação, muitos escritores escrevem “n” livros, nenhum é “Best-Seller”, nenhum cai no gosto do público, todos os livros ficam empoeirados nas estantes das bibliotecas, outros no lixo da História. Porém, alguns escritores com um livro, a exemplo de Kafka que é conhecido pelo “O Processo”, “O Pequeno Príncipe” de Antoine Saint-Exupéry, “O Menino do Dedo Verde” de Maurice Druon e tantos outros que a memória recusa dá exemplo.

     Lembro-me no último ano do 2º. Grau (Curso Médio), Jorge Amado era rejeitado subjacente pela elite cultural por ser um autor “pornográfico”, não era recomendado para adolescentes, conteúdo não seguro para todas as assembleias, depois que a Rede Globo adaptou seus romances para novelas como “Gabriela, Cravo e Canela”, “Terras do Sem Fim”, “Tereza Batista Cansada de Guerra”, ele tornou-se “Best-Seller”, houve até um movimento para que concorresse ao “Nobel de Literatura”. Hoje, Jorge Amado é unanimidade nacional.

     Logo, a atividade de escritor não é pra qualquer pessoa, mas, pra quem Deus reservou dotes especiais por merecimento divino, por isto, escrevinhador não é escritor.

 

Autoria: Rilvan Batista de Santana

Licença: Creative Commons

Membro fundador da Academia de Letras de Itabuna – ALITA

Imagem: Google

 

Rilvan Santana
Enviado por Rilvan Santana em 03/10/2023
Alterado em 05/10/2023


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