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Carta para Amanda R. Santana

Carta para Amanda
R. Santana



Querida amiga:

 
Recebi sua cartinha carinhosa e cheia de elogios que a humildade e a prudência me impedem de divulgá-la na integra, porém, sem os afáveis e não merecidos adjetivos, não vejo motivo de não lhe responder, pelo menos, parte de sua cartinha. Não cuide que não lhe goste, que não lhe tenha um afeto maior que a minha querida cidade de Itabuna, que não lhe queira bem, é que o seu amor por mim, impede-lhe de enxergar os meus obstinados defeitos, aí, os seus elogios me deixam sem jeito.
Se eu estou bem de saúde? Claro que estou bem, prova disto, estou lhe respondendo quase tudo que me perguntou, mas lhe sou sincero ao afirmar que o homem deveria viver no máximo 35 anos e se gozasse de saúde. É pouco tempo? Não, minha amiga, veja os homens que marcaram a História e viveram menos do que 35 anos de vida: Alexandre, o Grande, Jesus Cristo, Castro Alves, Álvares de Azevedo, Mozart, Noel Rosa... Trinta cinco anos, o homem está no ápice de sua atividade física e mental.
Vejo como hipocrisia alguém falar da velhice como a “melhor idade” se a velhice é a idade da dor aqui e acolá, a idade mal de Alzheimer, da diabetes, da hipertensão, do mal de Parkinson e doutras patologias geriátricas, além do velho ser por toda vida refém de remédios. Vida boa, minha amiga, é aquela que se vive em abundância!...
Querida Amanda, certa feita um médico me disse que o remédio é uma necessidade, é importante morrer com dignidade... Para mim, digna é a morte de um jovem pilotando um Fórmula 1 (razão de sua vida), do que um velho que morre entubado de remédios numa UTI para não sentir dor. O remédio para o idoso, minha amiga, é como se alguém consertasse um carro velho, conserta-se o câmbio, degringola a embreagem, solda-se o radiador, o sistema de temperatura não resiste.
Porém, minha amiga, quando tu me perguntas (olhe como estou esnobe, o verbo na 2ª. pessoa...), se ainda sou católico, tomo como uma provocação: “Quo vadis domine?”, não poderei responder como Jesus Cristo, que respondeu ao apóstolo que fugia para não ser queimado por Nero, imperador romano: “Já que abandonaste o meu povo, vou a Roma para ser crucificado, outra vez”, sou católico.
O bom cristão nunca fica pulando de galho em galho. Hoje, que as garagens deixaram de guardar os carros para servirem de sala para um novo pastor, bem faz quem é fiel à igreja fundada por Jesus Cristo. Conheço-te, sei que vais me recriminar, tu vais alegar que é melhor abrir uma “igreja” todo dia, do que uma cadeia, porém, não sei qual é o mal maior: aquele que explora a fé dos incautos, ou, aquele que se deixa arrastar na vereda do pecado? Tu és inteligente, tens a retórica e a lógica no sangue, tu deves discernir com precisão o que é melhor para o homem.
Querida Amanda, a igreja de Roma, ao longo desses XX Séculos, cometeu vários acertos e muitos equívocos, mas não é à toa que é a única igreja que está em pé depois de 2000 anos. O cisma provocado por Lutero e Calvino, não lhe foi tão prejudicial quanto essa enxurrada, hoje, de denominações religiosas, onde picaretas, charlatães, falsos apóstolos e falsos pastores oferecem curas milagrosas, aproveitando-se do desespero de pessoas simples e ingênuas e amealhando riquezas espúrias.
Acho que a igreja católica está em crise de vocação. Os nossos sacerdotes, com algumas exceções, não possuem preparo intelectual nem vocação religiosa para exercerem bem os seus ministérios, são pálidas figuras que não têm autoridade nem liderança para arrebanhar mais ovelhas, deveriam possuir, pelo menos, a ousadia protestante para aliciar novos seguidores. Suas homilias não cativam nem atraem...
Os ritos católicos pecam pelo tempo, embasados em releituras bíblicas desde São Paulo e São Pedro, se não fossem alguns sacramentos como a eucaristia, o batismo, a unção dos enfermos e o matrimônio, afora, a música e a mídia, a debandada dos fiéis para essas igrejas de porta de garagem, dos falsos curadores, seria maior.
Minha amiga, tu és a rainha da tentação, quisestes saber, também, se eu gosto do novo padre, tu sabes que não tenho papas na língua, que peco pela franqueza, ademais, a igreja não tem mais tribunais de inquisição, temos um estado democrático de direito, nem a ABIN tem subsidos para molestar o cidadão direito. Ademais, os bispos atuais, têm outra mentalidade e não poderiam ser diferentes, os meios rápidos e modernos de comunicação, escancaram para o mundo os deslizes, as truculências e o autoritarismo das autoridades em tempo recorde, por isto, responder-te-ei a seguir, as entrelinhas da tua capciosa curiosidade.
Não gosto nem desgosto do nosso padre, para mim, ele não fede nem cheira, ele não me diminui nem me acrescenta, é uma pessoa inteligente, mas desprovido de carisma, sem grande vôo, acho que não irá passar de pároco, seu discurso evangélico é igual resma de papel pardo, grande e amarelo! Esta semana, ele estava uma arara, se enrolou numa fábula, quis mandar um recado para alguém que o critica, disse que ignora os seus desafetos - não aprendeu a lição de Jesus Cristo, que mandou perdoar setenta vezes sete, ainda mais, na Semana Santa...
Espero nunca ser um infausto para ti, pois a nossa benquerença não é virtual, a nossa amizade não foi construída em falsa dialética, tu nunca serás decepcionada por mim, soubestes sempre aceitar as minhas qualidades e tolerar os meus defeitos.

Do teu amigo, que te preza e estima,

Rilvan Batista de Santana



Itabuna, 03. 04.2012
Rilvan Santana
Enviado por Rilvan Santana em 18/06/2015


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Imagem de cabeçalho: Sergiu Bacioiu/flickr