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Presente de Natal R. Santana

Presente de Natal
R. Santana
 
A única coisa que me interessava no Natal, naquela época, era ganhar meu presente. Não entendia bulhufas do nascimento de Jesus Cristo, aliás, não compreendia como Jesus de Nazaré, Filho de Deus, havia nascido num estábulo, deitado numa manjedoura, junto com as vacas e outros animais, ao invés de ter nascido num palácio suntuoso. Hoje, compreendo o mistério.
Quando ia à igreja, achava bonito o presépio iluminado e a imagem daquele pequerrucho, nu, em cima da alfafa, ou, nos braços de sua mãe, a Virgem Santíssima – era um deleite... Por outro lado, a cerimônia religiosa era tão austera e disciplinada que não ficava muito tempo na nave da igreja, preferia brincar de picula na praça da matriz junto à turma de minha idade, quando a sorte me bafejava e minha mãe Judite afrouxava o controle.
Também não gostava da “Missa do Galo”, de 24 a 25 de Dezembro, além de tarde, o latinório do padre não me empolgava. As missas eram em latim, somente algumas passagens do discurso evangélico, eram entendidas pelos fieis, o restante, os fieis balançavam a cabeça como catende. E, quando ele findava com “Benedicat vos omnipotens Deus, Pater, et Filius, et Spiritus Sanctus. Amém”, o rosto alegre se estampava em todo mundo, multiplicavam-se os abraços, pois o nascimento de Jesus aconteceu: Natal!...
A volta para casa era uma festa. Os nossos pais não mais exigiam cuidado com a roupa, arregaçávamos o bocal da calça, tirávamos os sapatos novos que começavam fazer calo e vínhamos brincando na estrada de chão. Os pais também vinham descontraídos, alegres por mais um Natal. A pressa ficava por conta da lauta ceia de cada família.
Eu tinha menos de 7 anos de idade quando ganhei o meu primeiro presente de Papai Noel, lembro-me que mãe Judite passou aquele ano contando-me histórias do bom velhinho rechonchudo: ele morava num lugar de muita neve com Mamãe Noel e fim de ano, ele colocava nas costas um saco cheio de presentes, montava no seu trenó puxado por muitas renas e percorria o mundo distribuindo presentes aos meninos bem comportados na noite de Natal.
Não havia televisão, portanto, não havia divulgação exagerada de imagem do bom velhinho, afora algumas pessoas que se travestiam de Papai Noel, com saco nas costas, casaco vermelho, gola e punhos brancos, calça vermelha e bainha branca e botas pretas (não havia trenó nem renas, Papai Noel percorria as ruas, geralmente, em cima dos carros), a divulgação da imagem do bom velhinho era feita nas “folhinhas” e nas revistas da época.
Às vezes, ficava imaginando como Papai Noel entraria em minha casa para deixar meu presente se não havia chaminé, então, paciente minha mãe Judite dizia que não me preocupasse, pois ele possuía poderes mágicos e entraria pela porta mesmo fechada, porém, que não me esquecesse de colocar o sapatinho (talismã) embaixo da cama. A chaminé só existia em terras frias, lá, as casas eram aquecidas pelo fogo de lenha para que seus moradores não morressem de frio. E, Papai Noel sempre deixava meu presente na noite de Natal mesmo com a porta fechada.
Hoje, os cabelos encanecidos, Papai Noel não me traz presente, a infância acabou e o sonho findou, a fantasia virou realidade...


Autor: Rilvan Batista de Santana
Licença: Creative Commons
Rilvan Santana
Enviado por Rilvan Santana em 09/12/2014
Alterado em 09/12/2014


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Imagem de cabeçalho: Sergiu Bacioiu/flickr