Textos


Nova carta para Atir

Nova carta para Atir
R. Santana



Querida Atir:



Ah Atir, tu não aprendeste ainda a diferença entre o amor e a paixão, os dois sentimentos que dominam as ações humanas. Não adiantou os inúmeros exemplos que te dei na carta anterior de figurinhas conhecidas na história humana. Ah Atir, tu és uma mulher inteligente, mas tu não perdeste ainda a aura sonhadora, mesmo longe os anos de tua adolescência.
Acho que tu não acreditaste em mim, nos meus conceitos, tu fizeste bem, eu não possuo nenhuma autoridade no amor e na paixão, porém, tenho a leitura e a experiência vivida nos outros. E a História está eivada desses exemplos, além de pescar nas águas e na autoridade do Aurélio a diferença desses dois sentimentos, vos tendes agora: “amor, sentimento que predispõe alguém a desejar o bem de outrem, ou de alguma coisa; paixão, sentimento ou emoção levados a um alto grau de intensidade, sobrepondo-se à lucidez e à razão”.
Sartre, o filósofo da existência e Simone Beauvoir, sua companheira de tantos anos viveram esse amor descrito por Aurélio: cada um zelando pelo bem-estar do outro, mas cada uma na sua... Entretanto, querida Atir, não poderia dizer o mesmo da paixão de Anita Garibaldi pelo revolucionário Giusepe Garibaldi, cruzando mares e fronteiras, combatendo com paixão e entrega homens e conflitos, para ficar junto do seu homem e do seu herói.
Li a tua carta que fala de uma “paixão virtual” transformando o impossível em “factível” e “vende” uma imagem ideal. Ora Atir, por mais que eu admire a tua inteligência, a mulher, tua sensualidade, tua sedução, permita-me lamentar a tua ingenuidade e a tua imaturidade na paixão e no amor.
O que tu chamas de “paixão virtual”, “sensualidade nas palavras”, eu diria: “comunicação virtual”, “fantasia”, “devaneio”, “sonho” e “imaginação”.
O amor é um sentimento abstrato enquanto categoria gramatical, mas este sentimento não prescinde do físico, do palpável, diz a sabedoria popular: “quem ama o feio bonito lhe parece”, ninguém ama o que não conhece. Não estou me referindo somente ao físico, concordo contigo e com o pensador que disse: “as palavras são corpos tocáveis, sereias visíveis, sensibilidades incorporadas”, as palavras bem articuladas têm o poder de formar imagens, construir sentimentos, ideais e sistemas, mas tudo é concreto ao nível do pensamento.
A paixão não tem limite, não obedece às filigranas morais, não tem preconceito e não tem nada que impeça os apaixonados viverem e morrer por suas paixões.
Atir querida, tu fujas desses pensamentos e dessas práticas virtuais. Não contentas e não induzas os incautos às paixões virtuais, pois com o advento da Internet, essas paixões não passam de perversões sexuais, de sadismos virtuais, de doenças mentais, com os egos e as imagens deformadas, às vezes, trazendo angústias, desesperos e frustrações com a imposição da realidade.
A dor física é passageira, mas as dores da alma de sentimentos frustrados, de sonhos desfeitos e de esperanças exauridas são perenes, eternos. Por isto Atir, não uses as tuas palavras, o teu conhecimento, para espalhardes falsas ilusões, pois debaixo de palavras ingênuas, subjacentes, tu estás espalhando sentimentos de perversão e maldade.
Há crime maior do que manipular mentes? Não! No Direito tem lá a figura do “autor intelectual”, que é tão ou mais perigoso do que aquele que pratica a ação. O autor intelectual é o dono da idéia, é aquele que planeja, corrompe pessoa e alguém executa. Não obstante possuir uma desenvoltura intelectual excepcional, em circunstâncias adversas, é um mau caráter medroso, pusilânime.
Enfim, continuo te admirando pela inteligência, pela desenvoltura das palavras, pela arte de escrever, mas condeno a tua apologia virtual, tua retórica e tua imaginação fúteis, comuns aos espíritos menos elevados e não a ti.

12.05.2008
Do homem pensante,

Narvil







 
Rilvan Santana
Enviado por Rilvan Santana em 19/08/2012
Alterado em 19/08/2012


Comentários


Imagem de cabeçalho: Sergiu Bacioiu/flickr