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Inferno Conjugal

Inferno Conjugal
R. Santana


Não digo quando nem onde esses fatos aconteceram nem se alguém pagar as minhas contas que não são poucas... Também não tenho ouvidos moucos. Ouvi cada palavra de graça e de graça estou lhe passando. Farei tudo para registrá-las aqui sem aumento de til ou cedilha. Se por acaso cometer algum deslize aumentando ou omitindo alguma frase que os autores dessas conversas matinais em praça pública me perdoem. Não fiz por mal, é que a minha memória não é de elefante e a minha inteligência é curta.
Se por desígnio do destino eles lerem este texto e acharem que quero lhes comprometer pela malversação dos fatos, não será necessário ir à justiça pedir direito de resposta, fá-lo-ei da melhor maneira possível e lhes darei uma polpuda indenização pelos danos morais. Não a darei por danos físicos porque não existe alguém mais covarde neste mundo de meu Deus, bateu os pés ameaçando, já estou correndo, pedindo socorro.
- E aí Zelito, tudo bem?
- Não, Adonias!... – Zelito estava visivelmente pra baixo, com olheiras e pálido. – Parece que você levou uma surra ou passou a noite insone?... - Completou Adonias.
- Estou mal assim? – Não, você está péssimo!
- É o diabo da mulher!... Você acredita que ontem ela cismou de medir a quantidade de por... por... na hora que estávamos fazendo amor? – O quê?... – Isso mesmo. Ela disse que a mulher do vizinho descobre esse delito... Terminei broxando.
- É... brincadeira!... – E o pior, ela anda dizendo à vizinhança que estou de caso com Artur. – Porquê?... Tem motivo? – Maluquice dela. Há limite na cabeça de mulher ciumenta? Acredito que por sairmos juntos para as peladas de finais de semana e tomarmos uma loirinha no bar de André de quando em vez.
- Você já tentou aproximar a mulher de Artur e ela pra diminuir a cisma? – Já! – E aí? – Ela cismou que a mulher de Artur era minha amante!...
- Zelito tem um provérbio oriental que diz: “... bata em sua mulher todos os dias porque se você não souber porque estar batendo, ela sabe porque estar apanhado...” – Adonias, você sabe que não sou disso. Sou de paz. Além disso, não posso dar desgosto aos meus filhos, eu amo-os.
Por capricho do destino, chega Artur também chateado, com a cara amarrada, de quem comeu e não gostou, foi a vez de zelito:
- E aí irmão?... – Tudo ok! – Mas o seu semblante, sua inquietude, falando e mexendo com as mãos e as pernas simultaneamente denunciavam Artur, seus colegas não deixaram por menos:
- Hum.. Hum... Nesse mato tem coelho Zelito, parece-me que o nosso amigo também está em maus lençóis! – Zelito completa: - E lençol de carrapicho que você fica rebolando na cama e não consegue dormir!... – Artur explode: - Vocês vão tomar naquele lugar!... Estou aqui puto da vida e vocês ficam caçoando... – Mais fofoqueiro, querendo entrar na intimidade de Artur, Adonias contemporizou: - Olhe, eu e Zelito queremos lhe ajudar. Achamos que você não está legal, porém, precisamos saber o que houve, senão, por onde começar? – Artur se abriu como macaxeira cozida:
- Vocês têm razão!... A minha mulher e a mãe dela estão me enchendo os bofes. Pois a destrambelhada da velha e a filha deram pra vistoriar a minha cueca e a minha camisa! – Pra quê? – Perguntou Zelito. – Para encontrar cheiro de perfume ou marca de batom. Vocês já pensaram em alguma pessoa má? Se encontram-na, multipliquem por dois que é minha sogra. Soube que maltratou tanto o ex-marido que ele se mandou pra São Paulo. E, o diacho ainda vive às minhas custas!... – Agora, Artur estava azedo e espumando cólera. Se sua sogra tivesse o infortúnio de passar por ali naquele momento, acho que a teria esganado tal a raiva que estava destilando. Para felicidade de todos, é que no meio da conversa chega mais um mal amado, Nildo. Divorciado e bonachão, ele leva as coisas na troça, aconselha-os:
- Não esquentem a cabeça! Quem esquenta a cabeça é palito de fósforo. Casamento é igual rolo de fumo. os primeiros cigarros são deliciosos... – E, o resto? – Perguntaram todos ao mesmo tempo. – Bem, o resto você fuma para não perder o dinheiro. – Todos caíram na gargalhada. Ele ainda justificou sua filosofia de vida:
- Entrei no casamento com apartamento e carro na garagem. Depois de quatro anos e dois filhos, tive que deixá-la. Hoje, não tenho apartamento nem carro. Moro de favor na casa da minha mãe e tenho que trabalhar como um condenado pra lhe dar uma pensão alimentícia. – O pessoal, então, disse:
- Você está mau companheiro!... – Não, estou feliz!... – Neste momento passa um menino vendendo jornal. Na primeira página está escrito com letras enormes:

“EMPRESÁRIO MATA MULHER E DEPOIS TENTA SUICÍDIO”

Na página policial depois da descrição do bárbaro e injustificável crime, o marido deixa escrito como epitáfio: “Me traiu.”


Autor: Rilvan Batista de Santana – Academia de Letras de Itabuna – ALITA

Gênero (Conto)













 
Rilvan Santana
Enviado por Rilvan Santana em 07/06/2012
Alterado em 03/08/2012


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Imagem de cabeçalho: Sergiu Bacioiu/flickr